Isolou-se de todos os que o conseguiriam compreender. E ajudar, se ao menos ele reconhecesse que necessitava de ajuda. Mas não o reconheceu. Talvez devido aos muitos anos de independência (várias vezes sentida como imposta); aos muitos anos a entrar e a sair de casa, da sua casa, silente, morta e fria. Achara sempre que, mais dia menos dia, alguém iria encher aquela casa de luz. Isso não aconteceu.
Começou a declinar os convites dos amigos: para jantar, para ir ao cinema, para dançar. Desculpava-se com um ligeiro estado gripal, o cansaço do trabalho, a visita que ia receber. Deitava-se, ao invés, no sofá, olhava para a televisão. Desligava a televisão. Ia até ao computador. Saía do computador. Pousava o livro após a leitura de um parágrafo só. Dirigia-se ao armário dos medicamentos. Um Prozac. Não, um só não. Um whisky. Regressava ao sofá e olhava o tecto. Finalmente alguma coisa que lhe agradava observar. O tecto, branco e liso e com sombras. Voava até à infância e criava objectos com as sombras, como gostava de fazer com as nuvens do céu. E assim se deixava ficar. Deixava-se sempre adormecer (naquele torpor).
Deixou de atender os telefonemas dos amigos. Eram chatos, não gostava de estar com eles, as suas conversas eram fastidiosas. Não queria saber. Passava os dias a sonhar com a noite. A noite, para ele tão quente e aconchegante. De manhã era horrível ter de se levantar. Começou a tomar um Prozac. Era-lhe tão mais fácil...
As pessoas começaram a notar. A apatia, os olhos vazios esbugalhados, à procura nunca ninguém soube muito bem do quê. Nunca ficaram a saber.
Uma noite, já perdida a conta aos comprimidos e ao álcool, decidiu que queria ver o mar. E foi, aos tropeções nos seus pensamentos. Admirou-o, belo, com recortes de luar. Huumm, como lhe iria saber bem sentir a água contra a sua pele, gélida e tranquila. Mergulhou.
Não voltou.