Ela passava quase sempre pela mesma hora. E ele, escondido por detrás do portão, verde velho e enferrujado, observava-a deliciado... Naquele momento parava tudo. As brincadeiras solitárias, os berlindes, as correrias, os jogos enlameados de futebol. Ela passava com o seu caminhar apressado e seguro e olhar cabisbaixo. Morena, olhos negros profundos, assustados, altivos na sua solidão. Ele perguntava-se, dia após dia, porque é que ela tentava esconder tanta graciosidade. E sonhava... que um dia iria crescer e poderia falar-lhe timidamente. Talvez até tocar-lhe suavemente num braço, ou nos cabelos lisos e escorridos. E quem sabe, dar-lhe um beijo fugidio...
À noite, deitado na sua cama, branca velha e enferrujada, perdia-se nela. Quem seria. Porque passava sempre ali e não falava a ninguém. Porque tinha aquele olhar vazio e longínquo. E sonhava que um dia iria resgatá-la da sua tristeza.
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