quarta-feira, 14 de junho de 2006

Percurso

Saiu de casa determinado a deixar-se levar pelo mundo. Pelo menos o pedacinho que o rodeia. Conduziu lentamente, a sentir o caminho debaixo dos pés. A perder-se na beleza das casas com muitos anos, com muitas histórias. Havia descoberto há pouco que as casas falam. E riem e choram e sentem e ouvem e murmuram palavras imperceptíveis (só porque nunca nos demos ao trabalho de tentar percebê-las).
Ao afastar-se da cidade conseguiu ver o céu. Estava lindo aquele céu de fim de tarde em tons laranja. Acabou por descobrir que o céu também fala. Mas não conseguia entendê-lo.
Andava devagar. A lembrar-se que adora conduzir... E que a velocidade dos dias já há muito não o permitia lembrar-se...
Finalmente chegou. Estava contente por reencontrar-se com o seu amigo que, não fora ele, talvez não voltasse a ver. Estacionou o carro a alguns metros do local para se lembrar do prazer de caminhar, que a velocidade dos dias quase o levava a esquecer.
Olhando em volta, o amigo que ainda não chegara, sentou-se calmamente na esplanada, por entre uma água e um café. E um, dois, três cigarros... E o amigo que ainda não chegara... Deixava-se crescer a ansiedade. Já não se lembrava de estar assim, só, num local pouco conhecido, com gente que não sabia quem. Já não sabia como estar. Será que reparam em mim? Perguntam-se o que faço aqui? Se espero uma namorada, uma amante, a minha mãe? Se já nada espero e deixo-me aqui ficar? Será que devo fingir que escrevo uma mensagem? A quem? A ansiedade começava a ferver-lhe...
E só depois se apercebeu do ridículo que estava a ser. Escudar-se no telemóvel pelo medo de enfrentar os outros? A realidade? A falta dela?
Perdia-se em perguntas vagas e assolapadas que se atropelavam sem que tivesse tempo de responder.
Foi interrompido pela chegada do amigo que, não fora ele, talvez não voltasse a ver. Sentiu-se confortado pela interrupção. Sentiu-se salvo! Era bem mais fácil assim...

3 comentários:

Ana Luar disse...

E nada se compara ao abraço de um amigo na hora da aflição... e fora dela tb. Amigo, é alguem escolhido por nós, por isso tem de ser especial!

bonifaceo disse...

É sempre bom rever um amigo. A situação do telemóvel revi-me nela, muitas vezes quando estou sozinho no café, lá vou eu ao telemóvel só por ir...
Beijo.

jomaolme disse...

Acho que todos nos escudamos em qlqr coisa qd estamos sozinhos num sitio...é desconfortável e parece q as pessoas estão sp a olhar...
Mas é bom qd finalmente chega a pessoa de quem estamos á espera p nos salvar da situação...

Bom fim de semana...o sol está a espreitar...

Beijokas